Lages é referência na compostagem de resíduos orgânicos

Por Luiz Del Moura

Iniciado em 2018, e tendo enfrentado período de pandemia da Covid 19, o Projeto Lixo Orgânico Zero foi concluído em 2022, com envio de prestação de contas final do convênio no mês de fevereiro de 2023 

O Sistema Lages de Compostagem é referência nacional e até internacional, comprovado, na prática, por meio da execução do Projeto Lixo Orgânico Zero (PLOZ). Projeto que contou com liberação de recursos de aproximadamente R$ 1 milhão por parte do Fundo Nacional do Meio Ambiente e do Fundo Socioambiental da Caixa Econômica Federal.

Quando inscrito no 1º Edital do Fundo Nacional de Meio Ambiente e Fundo Socioambiental/CAIXA, o PLOZ foi aprovado em 1º lugar entre 300 propostas enviadas por municípios e consórcios intermunicipais de todo o Brasil.

Antes disso, em 2014 já havia sido selecionado pelo Ministério do Meio Ambiente como uma das mais destacadas ações na área de “Práticas de Educação Ambiental e Comunicação Social em Resíduos Sólidos” e passou a fazer parte da Plataforma Virtual Educares. Em junho de 2016 foi um dos oito finalistas no prêmio “Engie Innovation Trophies”, na categoria “Excelência em Gestão”, realizado em Paris, França. Depois, em novembro de 2016 no evento “European Utility Week”, na cidade de Barcelona, Espanha, com o título de “Composting Biomass Ashes”, foi o segundo projeto mais votado pela internet naquele importante evento internacional.

Em nota técnica, expedida pelo Departamento de Gestão de Resíduos, do Ministério do Meio Ambiente, em 2023, além do comunicado da aprovação da prestação de contas, consta que após a análise de execução de todas as etapas do projeto, o município de “Lages pode ser considerado como uma referência na gestão municipal de resíduos orgânicos e (isso) deve ser amplamente divulgado, de modo que iniciativas semelhantes possam ser replicadas nacionalmente”.

Eficácia do Projeto é Comprovada – Avaliando o relatório de prestação de contas do projeto, o Ministério do Meio Ambiente constatou que em pesquisa amostral, com critérios estatísticos, aplicação de 2.909 questionários para mensurar o percentual de cidadãos que realizam a compostagem no município de Lages, o resultado foi o seguinte: indicação de que 48% daqueles que responderam o questionário composta os resíduos residenciais. “Assim, temos forte indicativo de que o objetivo geral do projeto foi cumprido”, revela a nota técnica.

A coordenadora do projeto e diretora municipal de Meio Ambiente, da Prefeitura de Lages, Sílvia Oliveira, explica que o Projeto Lixo Orgânico Zero interfere diretamente no “desvio das sobras orgânicas domésticas do Aterro Municipal, direcionando-as para o desenvolvimento da compostagem”, ou seja, para o Método Lages de Compostagem.

Mais de 90 instituições, entre elas escolas públicas, particulares, CRAS, CREAS, CASE, presídio masculino, empresas e hortas comunitárias firmaram termo de compromisso com o PLOZ. 

Parceria com o CAV-Udesc – O PLOZ foi desenvolvido no período de 2018 a 2022, pela Secretaria Municipal de Serviços Públicos e Meio Ambiente, em parceria com o Centro de Ciências Agroveterinárias da Universidade do Estado de Santa Catarina (CAV/Udesc-Lages).

A coordenação do projeto foi de responsabilidade da diretora de Meio Ambiente da Prefeitura de Lages, Sílvia Oliveira, com o acompanhamento dos bolsistas do CAV-Udesc-Lages orientados pelo professor Germano Güttler. “O papel do professor Germano foi o de orientar, acompanhar e motivar na otimização da compostagem nestas instituições e difundir informações à comunidade”, ressalta Sílvia Oliveira.

O sistema de minicompostagem teve origem em 2012 como projeto de extensão do curso de Agronomia da Udesc-Lages, coordenado pelo professor Germano Güttler. Depois disso, difundiu-se na comunidade lageana, uma vez que a prática de minicompostagem foi divulgada em diversos eventos comunitários pelo SESC e o Centro de Ensino e Apoio à Pesquisa (com recursos oriundos de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC, determinado pelo Ministério Público de Lages). 

A importância da compostagem na Educação Ambiental

O projeto voltado à minicompostagem tem obtido excelentes resultados ambientais, constituindo-se em tema de primeira ordem em escolas e na universidade, onde estudantes aprendem o método e se transformam em orientadores e multiplicadores dos objetivos a serem alcançados.

O objetivo do PLOZ é a preservação do meio ambiente e a natureza, através da compostagem dos resíduos orgânicos, gerando adubo para o cultivo de hortas caseiras escolares e comunitárias.

Por exemplo, os galhos das podas de árvores feitas pela Secretaria de Serviços Públicos e Meio Ambiente são triturados e a serragem é distribuída gratuitamente aos interessados em fazer a minicompostagem.

“A iniciativa de atuar junto às escolas evidencia a importância da Educação no processo de mudança de comportamento de uma sociedade, a exemplo da destinação adequada de resíduos. Os protagonistas do desenvolvimento deste projeto foram e tem sido os gestores, professores, merendeiras, colaboradores, estudantes, presidentes de associações de bairros, empresários, enfim, a comunidade que aderiu à proposta do PLOZ”, enfatiza Silvia Oliveira.

Abrangência do PLOZ

Segundo relata Sílvia, em 2020 o PLOZ conquistou importantes espações na mídia nacional. Isto ocorreu em plena pandemia, no momento em que a imposição do confinamento fez com que as pessoas se voltassem para práticas caseiras, com destaque para as hortas.

“O intenso uso de redes sociais proporcionado pela pandemia, colocou em grande evidência o programa, bem como o Método Lages de Compostagem, assunto intensamente comentado e postado em diversos grupos e sites no Brasil e exterior. Antes disso, em 2019, O PLOZ tinha sido premiado pelo Instituto Lixo Zero Brasil como a melhor iniciativa brasileira na área de Educação, recebendo novo prêmio em dezembro de 2020 na área de compostagem. Neste mesmo ano, juntamente com o projeto Vaso Compostor, o PLOZ foi tema de artigo da revista norte-americana Biocycle, que é referência mundial na área de compostagem”, destaca Sílvia.

“O Vaso Compostor, tecnologia que viralizou na internet, foi desenvolvida em parceria com Instituto Lixo Zero Brasil (ILZB) e a Juventude Internacional Lixo Zero (Zero Waste Youth Movement), e tem sido assistida por centenas de milhares de pessoas”, explica Sílvia.

Neste mesmo período, o projeto também foi apresentado no Orion Week e no Congresso Internacional Cidades Lixo Zero.

Gravimetria aponta resultados positivos do projeto

Resultados positivos do PLOZ puderam ser constatados por meio de gravimetria realizada no aterro sanitário municipal de Lages. Medição feita pela Unesc no final de 2019, revelou teor de 31% de resíduos orgânicos depositados no aterro, percentagem inferior a de 2011 que era acima de 50%.

E no final de 2020, em uma nova gravimetria, desta vez feita pela Projeta Ambiental Júnior, constatou-se que os resultados eram mais animadores. Uma percentagem bem menor de lixo orgânico estava sendo depositado no aterro sanitário: teor de resíduos orgânicos de 21,3%; teor de recicláveis 22,7%; teor de rejeitos de 56%.

Esses dados são positivos e bem melhores do que a média nacional, que é de 48% de resíduos orgânicos depositados nos aterros sanitários. O percentual de 21,3% representa cerca de 55% menos do que a média nacional.

“O percentual de 56% de rejeitos está muito acima de qualquer aterro sanitário do Brasil. São raras as análises gravimétricas no Brasil que ultrapassam a casa dos 30% de rejeitos. A maioria dos aterros apresenta teores de recicláveis bem acima dos 30%. E esta era a realidade de Lages na primeira gravimetria realizada em 2014 quando tínhamos 40% de recicláveis no aterro sanitário”, relata Sílvia Oliveira.

Sílvia Oliveira conclui que “o ‘lixo’ pode ser melhor explorado como potencial econômico, social e ambiental”, sendo que as pessoas precisam “estar atentas para que práticas com impactos positivos sejam cada vez mais adotadas e multiplicadas”.

Várias ações derivam desta importante iniciativa

Nas pegadas do sucesso já obtido pelo Projeto Lixo Orgânico Zero, a Secretaria Municipal de Serviços Públicos e Meio Ambiente deu início ao projeto Lages em Busca do Lixo Zero que consiste em um conjunto de ações práticas e cotidianas envolvendo serviços gerais de limpeza pública: coleta de pneus, eletroeletrônicos, coleta de lixo urbano e aquele gerado em unidades habitacionais no interior do município.

A Secretaria Municipal de Águas e Saneamento (Semasa) implantou o sistema de coleta do lixo urbano utilizando-se de contentores (recipiente plástico capaz de acondicionar 1 m3 de lixo). Além disso, instalou Ecopontos (containers) para o recolhimento do lixo reciclável, em determinados locais da cidade.

Outro ponto a destacar, em relação ao PLOZ, é que o programa abrange as hortas comunitárias, implantadas pela Secretaria Municipal de Agricultura e Pesca. Equipes de bolsistas do programa ensinam a comunidade a cultivar essas hortas por meio do Método Lages de Compostagem.

“Fazemos a entrega gratuita de material de cobertura (matéria orgânica de difícil decomposição) podas, trituradas, serragem de madeira não tratada para a comunidade e instituições”, destaca Sílvia Oliveira.

“Os bons resultados evidenciados são conquistas coletivas que partem das escolas para a comunidade de forma que podemos dizer que um grande círculo de responsabilidade compartilhada vem se formando e uma vez que cada cidadão faça a sua parte o ecossistema será preservado, partindo do local para o global”, conclui a coordenadora do PLOZ.

Origem do projeto de compostagem

Segundo afirma o professor Germano Güttler, o método de mincompostagem idealizado em 2005, desenvolveu-se de forma mais efetiva, em 2012.

“Em 2005 fazíamos trabalhos de extensão universitária em escolas públicas de primeiro e segundo grau, com o objetivo de implantação de hortas escolares. Então, sempre utilizávamos resíduos orgânicos das cozinhas das escolas. Entretanto, estes trabalhos apresentavam pequenos resultados, pois a atividade era cansativa, exigindo muito esforço físico de professores e estudantes. Em cerca de sete anos desta atividade, tínhamos cinco escolas que conseguiam, com muito esforço, manter hortas produzindo hortaliças”, conta o professor.

“Logo em seguida, mudamos o foco dos trabalhos ao verificarmos que o lixo orgânico era um dos maiores problemas ambientais de nossa cidade. Colocamos como prioridade o manejo destes resíduos orgânicos e, sempre que possível, utilizando-os para montar uma horta. Assim, a horta passou a ser uma consequência da compostagem”, prossegue o professor.

“Já em 2012, criamos um sistema mais eficiente e mais fácil para usar estes resíduos e batizamos esta nova técnica de Minicompostagem Ecológica (MCE). A MCE que criamos não era somente uma compostagem. Era um método diferente de fazer uma horta”, explica Germano.

Acredita-se, portanto, que as MCEs resultam em hortas que exigem menos de 20% do trabalho comumente utilizado em horta tradicional. “A MCE forma uma horta que praticamente dispensa o uso de pás, enxadas, regadores e mangueiras. A facilidade em montar uma horta sobre uma MCE é tão evidente que, durante os anos de 2013 e 1014, este sistema foi amplamente divulgado em nossa cidade e com mais de 100 escolas aderindo ao projeto. E em 2015, mais de 70 destas escolas estavam mantendo o projeto mesmo sem acompanhamento e orientação dos bolsistas do projeto de extensão universitária, mostrando que é uma tecnologia social, aberta e de fácil propagação”, ressalta o professor do CAV-Udesc.

“Utilizando as escolas públicas e as agentes de saúde do município como base de divulgação desta proposta, e apostando na capacidade de auto disseminação da tecnologia das MCEs, acreditamos que atingimos, com um baixíssimo custo, cerca de sete a dez mil residências, aumentando a compostagem residencial para mais de 30% dos domicílios de nossa cidade”, finaliza Germano Güttler.

Passo a Passo para a Minicompostagem Ecológica (MCE):

– Separar, na origem (nas cozinhas), os resíduos orgânicos dos demais resíduos sólidos;

– Escolher um local para fazer a MCE. Pode ser um canteiro no solo, uma jardineira, um grupo de vasos, entre outros;

– Os resíduos orgânicos devem ser colocados sobre a terra, concentrados em uma camada de 8 a 20 cm de altura, sem espalhar;

– Deve-se cobrir os resíduos orgânicos com uma camada de 3 a 5 cm de material orgânico de difícil decomposição e granulometria fina, tais como grama cortada, serragem, cinza de termoelétrica, folhas secas trituradas, podas de jardim trituradas entre outros;

– Repetir este processo diariamente colocando os resíduos orgânicos lado a lado, cobrindo-os com terra sem deixar espaços entre as colocações. Assim, forma-se uma compostagem laminar que é coberta com terra, a cada dia.

– É necessário mexer com um garfo de jardim algumas vezes (geralmente uma vez por semana), facilitando a oxigenação da compostagem, pois evita a presença de moscas, elimina eventual mau cheiro e acelera o processo de decomposição. Sempre que for necessário, após a aeração, cobrir novamente com os mesmos materiais para que os resíduos orgânicos não fiquem visíveis;

– Após 30 a 40 dias, a compostagem estará pronta, e devemos plantar mudas ou sementes de hortaliças, temperos, chás, flores sobre o material já decomposto. Este processo também pode ser realizado em um local fechado (como uma garagem) e o material, depois de pronto, pode ser levado para uma horta ou jardim.

– Seguindo estas orientações, o solo fica completamente coberto com uma espessa camada de matéria orgânica humificada. Todas sementes ou plantas, que estavam neste solo, são sufocadas por esta camada e a vegetação não brota e as sementes de inços não germinam. Portanto, o solo do canteiro não necessita ser virado com pá e também não se faz necessário o uso de enxadas para capina após o plantio das hortaliças. Esta espessa camada também mantém elevada a umidade do solo e a irrigação pode ser reduzida em 60 a 80% quando comparada com uma horta tradicional.

Texto: Iran Rosa de Moraes

Fotos: Ary Barbosa de Jesus Filho

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